segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

letlive.

Letlive: deixe o novo viver


Eu demorei alguns anos para começar a expandir meus horizontes musicais. Comecei a ouvir rock e rap, meus gêneros favoritos, por volta de 1993 e montei uma espécie de “grupo dos intocáveis”. Um grupo de não muito mais do que dez bandas/artistas que eu escutava sem parar. E ai de quem ousasse falar mal de algum deles.

O problema era que eu me mantinha de certa forma congelado no tempo. Não ouvia nada muito novo, nada “desconhecido”, nem nada do passado. Só depois de amadurecer, sob todos os aspectos, que fui aprendendo a escutar outros tipos de bandas, outras vertentes do rock, além dos grupos que os influenciaram e que foram infuenciados pelo meu “grupo dos intocáveis”. Foi assim que eu fui mais fundo no punk rock, no indie rock, no funk e na soul music. Eu imagino o quanto eu perderia se não tivesse adquirido o hábito de constantemente buscar novas bandas. Foi assim que descobri...sei lá...uns quarenta porcento das bandas que ouço hoje regularmente.

Outra forma muito efetiva de descobrir novidades musicais é através da colaboração dos meus parceiros de gosto musical. Aquela galera que você sabe que sistematicamente vai te indicar um som novo que muito provavelmente você vai gostar e vai acabar comprando cd, indo ao show, etc.


 Pois foi justamente através da indicação de um desses parceiros que eu fiquei sabendo da existência de uma banda chamada letlive. (se escreve assim mesmo, com letra minúscula e um ponto no final). Formado na cidade de Los Angeles em 2002, esse é um grupo relativamente dificil de encaixar em um estilo. A princípio seria uma banda de metal. Mas é mais do que isso. Metal moderno? Avant gard metal? Progressivo? Hardcore metal? Metal experimental? Eu diria que um pouco de cada. E é justamente aí que está o diferencial dos caras. Aliás, aí e nas caóticas performances ao vivo.

O vocalista do letlive. é o malucão Jason Butler. Se dando entrevistas ele parece ser um rapaz bem calmo e articulado para expor suas ideias, quando sobe no palco vira um bicho. Se joga no chão, na plateia, se pendura em qualquer lugar possível, enfim, um show a parte. Mas nada disso é forçado. A atitude de Jason no palco reflete a intensidade do som e das letras do letlive. que geralmente tratam sobre o comportamento humano em muitas de suas variáveis: sexo, religião, preconceito e por aí afora.

O grupo já passou por algumas mudanças em sua formação desde o lançamento de seu primeiro disco, “Speak Like You Talk”, em 2005, mas hoje conta, além de Jason, com os guitarristas Jean Nascimento (sim, brasileiro) e Jeff Sahyoun, o baixista Ryan Jay Johnson e o baterista Loniel Robinson.


Cinco anos depois do primeiro álbum a banda começou a chamar a atenção da mídia especializada com a chegada de “Fake History”. Este disco colocou o letlive. no rol das “promessas do novo metal”. Fez parte de várias listas do tipo “preste atenção nesta banda”. E não era pra menos, “Fake History é um excelente trabalho. Consistente e agressivo em quase sua totalidade, não fossem os momentos certeiros em que incluem em algumas músicas passagens melódicas, arranjos mais cadenciados e até mesmo uma participação de um vocal feminino (na faixa “Muther”). Mas veja bem. Essa mistura não serve pra adocicar o som dos caras. Nem pense em ouvir “Fake History” achando que vai encontrar um metal acessível estilo Linkin Park. Os berros de Jason e as guitarras competentes de Jean e Jeff dão exatamente o que uma banda de metal precisa. Adicione a isso a “cozinha” afiadíssima que acaba dando um toque especial às composições do letlive..

Difícil destacar três ou quatro faixas que me agradam mais neste LP. Talvez eu fique com “Le Prologue’’, “The Sick, Sick, 6,8 Billion”, “Casino Columbus”, “Muther” e “H. Ledger”. Opa! Citei mais de quatro músicas. Pois é. Eu avisei que o disco é excelente.

Já sob o status de banda estabelecida no cenário alternativo do metal, o letlive. partiu para a gravação de seu terceiro trabalho de estúdio. Em julho de 2013 lançaram “The Blackest Beautiful”. Eu já ouvi o álbum umas três vezes para poder fazer uma análise minimamente justa. O que pude observar logo de cara é que não é uma mera cópia do disco anterior. Nitidamente os caras tentaram variar um pouco em relação a “Fake History”. Não dá pra dizer que experimentaram mais porque seu antecessor já foi bem experimental. Mas, no geral, as composições desaceleraram um pouco, sem perder a característica caótica, típica desses californianos.



A primeira faixa, “Banshee (Ghost Fame)”, tem uma pegada meio hip hop no início, mas mais adiante alterna passagens melódicas e gritos ensandecidos. “Empty Elvis” e "The Priest and Used Cars" também são bem pesadas e facilmente entrariam no cd anterior. Já "White America's Beautiful Black Market" me chamou a atenção pela letra na ponte: “we get sick so they can feel better”, cantada por Jason de forma desesperada. Um dos pontos altos do disco.

Três canções específicas, "That Fear Fever", "Virgin Dirt" e "Younger" marcam a desaceleração das composições do grupo que eu citei anteriormente. A segunda está proxima de ser uma balada e se destaca por um trecho da letra que diz “love is just a cancer and sex is just a pill”. A última beira o pop rock. Talvez seja o único momento meio sem graça do álbum.

A última faixa é “27 Club”. Extremamente agressiva, é uma das melhores músicas do repertório do letlive. e já vinha sendo executada nos shows da banda antes do lançamento de “The Blackest...”.  Não poderiam ter escolhido um encerramento mais adequado.


Apesar de me fazer lembrar nitidamente de outras bandas que possam tê-los influenciado como Deftones e Ill Nino, dá pra perceber que o letlive. tem uma identidade própria. Musicalmente falando e pela sua surpreendente postura ao vivo, como já afirmei aqui. Eu fiz questão de dividir com alguns amigos uns trechos de shows dos caras e a reação quase sempre foi a mesma: um espanto inicial e logo em seguida a constatação de um som frenético e bem “in your face” mesmo.

Por enquanto o grupo continua com o status de sensação do underground. Não acredito que isso deva mudar muito nos próximos anos. Não consigo imaginar o som do letlive. excessivamente exposto pelas grandes mídias. Nunca vi um clipe sequer deles em uma MTV ou Vh1 da vida. Por mim, tudo bem. Eu já consegui descobrir que a banda existe. Quem ainda não havia descoberto, pode ter acabado de fazê-lo por aqui ou vai acabar descobrindo cedo ou tarde através de algum garimpeiro da boa música como eu e meus parceiros. Boa sorte!
  


Clique aqui para ver o letlive. ao vivo no Orion Festival - Junho de 2012

Clique aqui para ver entrevista com Jason Butler

Clique aqui para ouvir o álbum "Fake History" na íntegra

Clique aqui para ouvir o álbum "The Blackest Beautiful" na íntegra

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